sexta-feira, 19 de março de 2010

As desigualdades de género

Nas últimas décadas, principalmente depois de 1974, muitas alterações têm vindo a ocorrer na sociedade portuguesa, quer na vida social e familiar, quer nos comportamentos ou na actividade profissional dos indivíduos. Muitas destas alterações estão intrinsecamente ligadas ao surgimento de novos conceitos de mulher e cidadão, dado que a condição feminina e o seu novo papel na sociedade e na vida pública, ganharam uma nova dimensão, principalmente porque ela passou a ter acesso ao mercado de trabalho, ao ensino e a cargos públicos, anteriormente apenas reservados aos homens. Com a lei nº 621-A/74 que abole todas as restrições baseadas no sexo e com a alteração do texto constitucional no que respeita às tarefas fundamentais do Estado e o princípio da igualdade, marca-se de forma definitiva essa mudança. Até então, a mulher tinha uma existência diminuída, sem autonomia e com estatuto social e jurídico diferenciado e desvantajoso, a vários níveis, relativamente ao homem. A mulher era vista como um ser com capacidades diminuídas e como propriedade do marido, não tendo qualquer autonomia, nem mesmo financeira, já que era o marido o administrador dos bens do casal e era também a ele que cabia o papel de sustentar a família. A mulher limitava-se ao seu papel de esposa, mãe e dona de casa.
Com a entrada massiva da mulher no mercado de trabalho, o aumento gradual do nível de estudos no sexo feminino e o desenvolvimento dos métodos contraceptivos, a mulher tem vindo a conseguir uma maior autonomia, passando a desempenhar também papéis que antes estavam reservados aos homens. Segundo dados retirados do estudo do Instituto Nacional de Estatística, Mulheres e Homens em Portugal nos Anos 90, publicado em 2002, na década de 90 assiste-se a uma alteração na relação do número de licenciados entre os dois sexos. Se em 1992 a percentagem de mulheres licenciadas era de 3,7% e 4,6% para os homens, no ano de 1999 tinha-mos 6,1 % das mulheres e 4,9% dos homens com o ensino superior e em 2006, havia por cada 189 mulheres com ensino superior por cada 100 homens.
No início dos anos 90, mais de um terço das mulheres portuguesas deixou de estar ligada apenas às supracitadas categorias. Em 1995, cerca de 42,6% da população activa eram mulheres e mais de 50% eram mulheres casadas, que exerciam uma profissão. Segundo dados do INE relativamente ao 1º trimestre de 2006, a população empregada em Portugal atingia neste período os valores de 5126,9 (milhares de indivíduos), correspondendo a uma taxa de actividade da população de 62,2%. A taxa de actividade das mulheres em idade activa atingia os 55,9%.
Devido a estas alterações, tanto os modelos de família, como as obrigações familiares e do Estado, foram-se desenvolvendo de forma a adaptar-se a essas transformações sociais e económicas. Juntamente com estas verificam-se igualmente alterações nas práticas familiares e conjugais que revelam algumas atitudes, que alguns designam de “mais modernistas”, como o aumento dos casamentos civis em detrimento dos religiosos e aumento das uniões de facto ou a baixa na natalidade e de nascimentos tardios.
Estas alterações sociais têm levado, igualmente, a uma crescente importância das questões de género, nomeadamente, a repartição das tarefas domésticas, que tem sofrido um esbatimento devido ao papel que a mulher tem assumido na família e na sociedade. Estas alterações, especialmente as que se relacionam com a situação de trabalho, obrigam a mulher a despender mais tempo fora de casa com a consequente alteração dos hábitos tradicionais, que associam a mulher às tarefas domésticas incluindo o cuidar dos filhos. Segundo dados do INE, por exemplo, as taxas de actividade para a população activa, tem crescido nas mulheres, registando o valor mínimo de (40,9%) em 1992, e o valor máximo em 1999 (44,2%), enquanto nos homens se tem mantido homogénea por volta dos (57%).
Outra alteração verificada prende-se com as diversas iniciativas legislativas na área laboral, como a recente Lei da Parentalidade (DL-91/2009), no sentido de adaptar a vida profissional à vida familiar e pessoal dos indivíduos, tal como o reconhecimento do direito à maternidade e paternidade como valores sociais, artºs 59º e 68º da Constituição da República Portuguesa. Mas, infelizmente o que se observa é que não existe uma correspondência real entre as práticas, os valores e a Lei.
(continua)

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