quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Correr atrás de uma utopia ou virar escravo de novo

Segundo diz o Sol na sua edição on line de 2 de Agosto de 2011, o ministro das finanças, Álvaro Santos Pereira, no final da sua declaração inaugural salientou que «os sacrifícios do presente não serão em vão». Ao ler este tipo de afirmações, nem sei se devo rir ou chorar, se devo fingir que não li ou esquecer que li, se devo partir para o insulto ou partir para a violência pura e dura. Não é que alguma destas soluções resolva alguma coisa no meu dia a dia ou nas minhas dificuldades económico financeiras, mas talvez aliviasse um pouco a pressão, ou, como se diz muito agora, me aliviasse o stress. É que eu não sei se o que me revolta mais é o facto de eu saber que nenhum sacrifício que eu faça - quando digo eu digo também tantos milhares/milhões de outros trabalhadores portugueses e cidadãos por este mundo fora - vai resolver esta ou outra qualquer crise, ou, se o que me revolta mais é saber que existem pessoas, como este ministro, que nos vem tratar, mais uma vez, como um “bando” de débeis mentais, imbecis ou pessoas desprovidas de qualquer tipo de inteligência ou capacidade de raciocínio.
Hegel dizia que “ A religião é o ópio do Povo” e isto, dito por outras palavras, significa prometer o paraíso/céu, a realidade ilusória, como recompensa dos males vividos na existência real, para aguentar/tolerar viver feliz aceitando todos os sacrifícios terrenos sem questionar ou pôr nada em causa. Ora nada melhor para manter o povinho calmo e sereno do que o desconhecimento, pior, a aceitação da ignorância como o prelúdio de uma felicidade futura. Mas como nem todos são devotos, então, tem que se adaptar a linguagem, intervindo com este tipo de promessas, mais laicas, mas igualmente falaciosa.
Ninguém diz ao povo que estamos na mão da Banca e dos especuladores, que os países são geridos por estes senhores, segundo consta, o mundo está nas mãos de menos de 400 famílias. Muitas destas famílias, como os Rothschild e os Rockfeller, estão na origem da criação dos maiores bancos americanos e posteriormente das grandes entidades financeiras como o FMI ou o Banco Mundial. São estas entidades que simplesmente controlam a economia mundial. Não movimentam dinheiro na economia mas sim papeis e, desta forma, ao emprestar mais dinheiro (virtual) do que aquele que têm nas suas reservas, lá vão enriquecendo com os juros que cobram. Com este tipo de operações, são retiradas de circulação, grandes quantidades de moeda (dinheiro) com o consequente efeito directo na falta de liquidez aos bancos e indirecto na taxa de inflação, subida de juros, aumento do desemprego, quebra na produção e no consumo, etc. Os prejuízos, para as economias dos países e dos seus cidadãos, tem efeitos incalculáveis e com os quais, os detentores do poder económico, aparentemente, não estão minimamente preocupados.
Ninguém nos informa que essas entidades lucram desmesuradamente com este tipo de especulação que levam países à “bancarrota” e são, de uma forma premeditada e através da especulação e oscilação das acções no mercado, as responsáveis por levar pessoas e países à falência de uma hora para a outra, sem qualquer escrúpulo. As acções são colocadas no mercado e são manipuladas de forma a valorizarem, por vezes atingem 20% acima do valor sistema produtivo, e depois desvalorizam de um momento para o outro levando a perdas astronómicas de investidores, de empresas estratégicas e de bancos nacionais. Foi algo idêntico a isto que aconteceu na América, o bem conhecido Crash ou Grande Depressão de 1929 ou com o Banco do Brasil na década de 90.
Ninguém nos informa que tudo isto é um esquema montado que tem levado ao endividamento de países como a Indonésia, o Japão e todo o Sudeste Asiático na década de oitenta/noventa e, mais tarde, atingiu igualmente muitos países da América latina, como o Brasil. Presentemente estende-se já a muitas economias mundiais, nomeadamente, a muitos países da a União Europeia, como bem sabemos. Eventualmente, apenas escaparão aquelas economias cujo capitalismo está mais amadurecido, no entanto, correm sérios riscos de caírem também por arrasto.
O engraçado, no meio desta trapalhada toda, é que este problema surge nos Estados Unidos da América. Primeiro, quando os grandes empresários ou capitalistas, retiraram os seus poupança/depósitos da banca, desinvestiram no mercado levando os bancos e a economia à falência, pois à falta de liquidez (falta de moeda) juntou-se o desemprego, dívidas e falta de consumo interno; segundo, quando já na década de 60/70 se incentivou os americanos ao consumo levando-os o super endividamento das famílias e do próprio estado Americano que gastava mais do que produzia, sendo obrigado a contrair empréstimos externos, importar mais do que exportar e pagar em títulos do tesouro. A actual crise voltou a surgir vinda do outro lado do atlântico, com a crise imobiliária e consequente falência dos grandes bancos americanos.
De uma forma genérica e simplista diria que a América passou a viver com o dinheiro dos outros países e a pagar com o tal dinheiro virtual, títulos do tesouro Americano, ou seja, os países emprestam em dinheiro ou vendem bens e recebem papeis. Sem dinheiro a circular nas suas economias, os sistemas produtivos passaram a produzir menos que os sistemas financeiros. Muitos dos países financiadores da América faliu, enquanto que a América, se continua a consumir acima do que se produz e a dívida continua a galgar sem controlo à vista. Presentemente é o país do mundo que maior dívida pública tem, mas contorna a situação, por exemplo, através da emissão de moeda própria. Claro que economias emergentes como a China, uma das grandes financiadoras do EUA, além de cobrar os juros da dívida está, também, através de uma produção “escrava”, a encher o mercado americano e mundial, de produtos baratos, presenteando os consumistas, mas, desmantelado ainda mais todo o sistema produtivo americano e mundial. O que daqui resulta é o colapso do sistema produtivo interno de cada país e aumento da dívida externa, pois para fazer face às dificuldades internas geradas pela falência das empresas, pelo aumento do desemprego e pela subida das taxas de juro é necessário, recorrer à ajuda externa, ou ao FMI, Banco Mundial e afins, ou fazer como a América, comprar/utilizar dinheiro virtual.

O consumismo assumiu um papel central neste processo de endividamento das famílias, dos bancos e dos países. Consumir mais do que se produz, pagar juros altíssimos dos empréstimos feitos ao Banco mundial e ao FMI, levam a que estejamos cada vez mais dependentes dessas entidades supranacionais. Bem podemos trabalhar, trabalhar, trabalhar que nunca iremos conseguir produzir o suficiente para cobrir as dívidas que resultam directamente da especulação gerada pelas instituições financeiras e pelos juros da dívida que, diria, fomos obrigados a contrair. É um ciclo vicioso, quanto mais devemos mais temos que pagar, dado que uma boa parte do que produzimos é para pagar juros, o restante não chega para o essencial e daí resulta que temos que contrair mais dívida. Enquanto isso, apenas trezentas e tal famílias no mundo, estão cada vez mais ricas e mais poderosas e uns quantos países estão cada vez mais perto do seu objectivo, o de governar o mundo.
A solução passa pelo regresso à época anterior à idade média, ou seja, à troca de bens e serviços por bens e serviços. Eu tenho ovos e vendo por 1kg de peixe, ou eu tenho uma casa e troco com a tua, ou eu arranjo-te a canalização e tu vais arranjar-me o telhado, etc. Se o povo, o cidadão que paga sempre a crise, não recorrer ou recorrer o menos possível aos bancos, utilizar o dinheiro o mínimo possível nas suas transacções comerciais e/ou serviços, se todos nós passar-mos a valorizar cada vez menos dinheiro, todo o sistema financeiro se irá desmoronar. É que eles também estão dependentes do consumo. Se não existir necessidade de utilizar moeda nas transacções, se não existir necessidade de recorrer aos bancos ou ao dinheiro, como é que esses senhores/instituições vão sobreviver? Não vão, a não ser que se adaptem àquilo que os cidadãos ditarem. Pode parecer utopia, mas já funcionou e se nada for feito agora, vamos voltar à época da escravatura, trabalhar para os senhores a troco de quase nada.